segunda-feira, 30 de abril de 2018

ABRAINC E FIPE: VENDAS DE IMÓVEIS DEVEM CRESCER 15% EM 2018



As vendas de imóveis no país devem crescer 15% em 2018, para o patamar de aproximadamente 120 mil unidades, de acordo com projeções da Associação Brasileira de Incorporadoras (Abrainc) feitas em parceria com a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe).

Se as estimativas forem confirmadas, o mercado imobiliário voltará ao mesmo nível de vendas registrado em 2014, antes do aprofundamento da crise econômica nacional.

Até fevereiro, as vendas acumuladas em 12 meses chegaram a 78,6 mil unidades, enquanto os lançamentos foram a 85,3 mil unidades, segundo dados divulgados há pouco pelas instituições.

“É possível dizer, categoricamente, que o pior já passou. O que não quer dizer, porém, que o setor já está a salvo”, observou o economista da Fipe, Eduardo Zylberstajn, durante apresentação dos números em evento organizado pela Abrainc.

Zylberstajn afirmou que, pelo lado positivo, a economia brasileira deixou para trás a recessão e conta com um cenário marcado pela redução dos juros e da inflação.

Por outro lado, o economista ponderou que as vendas de imóveis ainda são limitadas pela falta de uma recuperação vigorosa da geração de empregos e pelo baixo nível de confiança dos consumidores. “Por mais que a confiança tenha melhorado, ainda estamos em patamares historicamente baixos. Ainda há muita incerteza e insegurança no ambiente”, afirmou, acrescentando que não há indicação de uma retomada mais forte dos empregos no curto prazo.

Zylberstajn estimou que o avanço do setor deverá ser sustentado pelo crescimento das atividades do programa Minha Casa Minha Vida (MCMV), segmento em que há maior demanda e condições mais favoráveis de financiamento.

Por sua vez, os imóveis voltados para o mercado de médio e alto padrão ainda devem evoluir lentamente. Segundo projeções da Fipe e Abrainc, o Minha Casa Minha Vida deve responder por 64% das vendas em 2018, ante 42% em 2014.

Apesar da estimativa de crescimento das vendas, o economista ponderou que não há sinais de um aquecimento nos preços dos imóveis. Durante o “boom” do setor na última década, essa valorização foi sustentada pela redução dos juros e pelo alongamento do prazo de financiamento pelos bancos.

“Com o juro que temos hoje, aparentemente, o preço está de acordo com os seus fundamentos. Qualquer valorização mais forte no preço dos imóveis precisaria passar por uma queda relevante nos juros, aumento dos prazos e recuperação do mercado de trabalho, o que não parece ser o caso para o curto prazo”.

Fonte: Exame

quinta-feira, 19 de abril de 2018

IMPOSTO DE RENDA: STJ DIZ QUE VENDER IMÓVEL PARA QUITAR OUTRO É ISENTO



Nesta terça-feira (17), a 1.ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou que é isento de imposto de renda o ganho de capital resultante da venda de imóvel residencial utilizado para quitar, total ou parcialmente, o financiamento de outro imóvel residencial. Com isso, o colegiado confirma a decisão sobre o mesmo tema tomada pela 2.ª Turma em outubro de 2016 e abre caminho para que mais cidadãos contestem a incidência do tributo sobre esse tipo de transação.

Atualmente, as decisões do STJ representam apenas precedentes judiciais e, neste acaso, não alteram as normativas da Fazenda sobre o assunto, explica Paula Farias, advogada especialista em Direito e Negócios Imobiliários. “Com mais processos tratando do assunto, porém, possivelmente ter-se-ia um recurso repetitivo e, a partir de então, com a decisão do STJ a respeito do assunto, teríamos a obrigação de sua aplicabilidade em todo território nacional”, pondera a advogada. 

Outra possibilidade é que, a partir da decisão, a própria Fazenda ou o Congresso sinta-se estimulado a prover segurança jurídica para o novo entendimento.

Se por um acaso nem todo o valor do imóvel vendido for utilizado na quitação de outro, aí sim, o IR sobre o valor não utilizado terá de ser recolhido. Isso deve ser feito dentro do que preveem as normativas da Receita Federal, ou seja, dentro de 180 dias após a transação.

O caso que resultou no novo entendimento

Segundo a assessoria de imprensa do STJ, o que ocorreu nesta terça-feira (17) é que o colegiado da 1.ª Turma negou provimento a recurso da Fazenda Nacional por considerar ilegal a restrição imposta por instrução normativa às hipóteses de isenção da Lei 11.196/05. Na prática, a decisão unifica o entendimento de duas turmas de direito público do STJ: em outubro de 2016, a 2.ª Turma já havia adotado o mesmo entendimento ao julgar o Recurso Especial 1.469.478, que teve como relator para acórdão o ministro Mauro Campbell Marques. 

De acordo com informações repassadas pelo STJ, o processo julgado na Primeira Turma, um casal vendeu a casa onde vivia em março de 2015 e, no mesmo mês, usou parte do dinheiro obtido para quitar dívida habitacional com a Caixa Econômica Federal. Entendendo fazer jus à isenção prevista em lei, o casal recolheu o IR incidente sobre o ganho de capital relativo à venda de imóvel apenas sobre os valores não usados para quitar o financiamento. 

O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) reconheceu ser válido o direito de não recolher IR sobre o lucro obtido na venda da casa própria, na parte usada para adquirir outro imóvel, conforme preceitua o artigo 39 da Lei 11.196/05. 

A Fazenda Nacional questionou a decisão, com base na restrição prevista na Instrução Normativa 599/05, da Secretaria da Receita Federal, que afirma que a isenção não se aplica ao caso de venda de imóvel para quitação de débito remanescente de aquisição de imóvel já possuído pelo alienante. 

Normatiza da Receita tem “ilegalidade clara” segundo colegiado 

Segundo a relatora do caso na Primeira Turma do STJ, ministra Regina Helena Costa, ao se comparar a Lei 11.196/05, conhecida como Lei do Bem, à instrução normativa da Receita Federal, fica clara a ilegalidade da restrição imposta pelo fisco ao afastar a isenção do IR para pagamento de saldo devedor de outro imóvel já possuído, ou cuja promessa de compra e venda já esteja celebrada. 

“Desse modo, o artigo 2º, parágrafo 11, inciso I, da Instrução Normativa SRF 599/05, ao restringir a fruição do incentivo fiscal com exigência de requisito não previsto em lei, afronta o artigo 39, parágrafo 2º, da Lei 11.196/05, padecendo, portanto, de ilegalidade”, explicou.

“O que fica claro na decisão é que a lei, feita pensando-se no fomento do mercado imobiliário, deve ser interpretada com mais abrangência, ou seja, de forma não limitada apenas à aquisição de um imóvel novo, como já era o entendimento do Fisco”, explica Paula Farias.

Fabiane Ziolla Menezes
Fonte: Gazeta do Povo

terça-feira, 10 de abril de 2018

GARANTIAS LOCATÍCIAS: CESSÃO FIDUCIÁRIA DE QUOTAS DE FUNDO DE INVESTIMENTO



Prevista no inciso IV, do artigo 37, da Lei 8.245, de 18 de Outubro de 1991 - Lei do Inquilinato, a cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento foi incluída ao rol de garantias locatícias por intermédio da edição da Lei 11.196, de 21 de Novembro de 2005, e disciplinada complementarmente pela Instrução 432 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) , de 1° de Junho de 2006, que dispõe sobre a constituição, a administração, o funcionamento dos fundos de investimentos destinados à garantia de locação imobiliária e a cessão fiduciária, em garantia de locação imobiliária.

Tendo o legislador pormenorizado a função, bem como a estrutura jurídica, desta modalidade de garantia, as quais encontram-se gravadas no artigo 88, e seus respectivos parágrafos, da Lei 11.196/2005, passível de afirmação de que a cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento é uma garantia típica.

Por outro prisma, esta garantia também pode ser classificada como sendo uma garantia real, isto pelo fato de que a transferência necessariamente ter que ocorrer da titularidade sobre as quotas de determinado fundo de investimento do locatário, ou de terceiro cedente, para o locador, as quais estarão, e permanecerão, sob a guarda de uma instituição financeira, que, neste contexto, figurará como agente fiduciário.

Nota-se, por oportuno, que não houve imposição restritiva do legislador em relação à quantidade, ao tipo ou ao valor das quotas cedidas em garantia, diferentemente do que ocorre com a caução em dinheiro que é limitada monetariamente ao valor máximo correspondente à até três aluguéis, vigentes à época de sua instituição. Assim, depreendemos desta situação um ponto a ser avaliado como positivo no tocante à escolha da cessão de quotas de fundo de investimento como modalidade de garantia locatícia a ser pactuada no contrato de locação.

Como mencionado, as quotas de fundos de investimento, que servem como garantia locatícia, estarão sob a custódia de uma instituição financeira e a razão pela qual tais quotas estão sujeitas a este controle são as regras impostas pela Comissão de Valores Mobiliários, as quais seguem no sentido de que somente as instituições autorizadas para o exercício da administração de carteira de títulos e valores mobiliários estão autorizadas a constituir fundos de investimento que permitam a cessão de suas quotas em garantia de locação imobiliária, conforme previsto no caput, do artigo 88 desta Lei, de tal sorte que, com fulcro no § 10°, deste artigo, a instituição financeira, além de ser o agente responsável pela custódia das quotas, ficará também pela retenção e recolhimento dos impostos e contribuições incidentes sobre as aplicações efetuadas no fundo de investimento, assim como pelo cumprimento das obrigações acessórias decorrentes dessa responsabilidade.

Para que haja a efetivação da cessão de quotas de fundo de investimento como garantia locatícia, este procedimento de transferência deverá ser formalizado perante o administrador do fundo de investimento, por intermédio da ratificação do termo de cessão fiduciária, que constituirá propriedade resolúvel sobre as quotas em favor do locador. Deste modo, devendo ser respeitada a forma escrita, assim como a solenidade prevista no § 1°, do artigo 88, da Lei 11.196/2005, entendemos, com base nos artigos 104, inciso III, e 166, inciso IV, da Lei 10.406, de 10 de Janeiro de 2002 - Código Civil, que qualquer convenção desta garantia de forma verbal, ensejará em nulidade do negócio jurídico, isto em razão do descumprimento do mandamento solene insculpido no parágrafo em análise.

Outrossim, entendemos, de igual maneira, que esta interpretação estende-se à ausência do registro do termo de cessão de quotas perante o agente fiduciário, visto ser esta também uma formalidade a ser rigorosamente cumprida para que haja a instituição desta garantia. Ressalvamos, ainda, a relevância desta conduta, já que é por meio do registro que a situação jurídica das quotas ofertadas em garantia torna-se pública, fato este que, além de revestir a cessão de quotas de segurança jurídica - principalmente para o locador, que poderá transformar-se em eventual credor -, também reduzi-se o risco de ocorrer a transferência fraudulenta da titularidade destas mesmas quotas para terceiro de boa-fé, desconhecedor da situação jurídica real destes valores mobiliários, o que resultaria em prejuízo em desfavor do locador.

Determina a Lei 11.196/2005, em seu artigo 88, § 3°, que a cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento como garantia locatícia, mediante o cumprimento dos trâmites já examinados, constituirá regime fiduciário sobre as quotas cedidas, quer pelo locatário quer por terceiro cedente, tornando-se estas indisponíveis (isto é, não sendo passível de disponibilidade para negociações), inalienáveis (ou seja, que não poderão ser vendidas pelo seu titular) e impenhoráveis (o que significar dizer que estas quotas não poderão ser utilizadas como quitação de dívidas para outros credores, senão daquelas oriundas do contrato de locação, garantido pela cessão fiduciária operada), passando a ser o agente fiduciário a instituição financeira administradora do fundo de investimento.

Logo, pela imposição dos mencionados regimes jurídicos, o ato de transferência da titularidade sobre as quotas vinculadas à cessão fiduciária ficará amplamente limitado, evitando-se, deste modo, que, no momento da execução destes bens jurídicos incorpóreos, perante o Poder Judiciário ou em caráter extrajudicial, quaisquer revés à consumação da própria garantia contratada. Assim, consideramos ser este aspecto uma das vantagens em se optar por esta modalidade de garantia.

Há de cumprir-se também o dever de entregar uma via do contrato de locação firmado pelas partes, documento no qual deverá constar a existência, as condições e o prazo de vigência da cessão das quotas, podendo ser este determinado ou indeterminado, conforme previsto no § 4°, do artigo 88, da Lei 11.196/2005. Logo, em decorrência da liberdade de escolha ofertada pelo legislador às partes contratantes, três são os cenários possíveis.
Inicialmente, como primeira hipótese, em sendo a garantia contratada por prazo inferior face ao tempo de vigência do contrato de locação, quando alcançado o termo final, por consequência, estará a garantia extinta, interrompendo, deste momento por diante, a responsabilidade do garantidor, restando, por consequência, desprovido de garantia o contrato de locação.

Já como segunda situação, caso a garantia seja convencionada pelas partes contratantes por período igual ao do instrumento de locação, em ocorrendo a prorrogação do contrato por força do artigo 39 da Lei 8.245/1991, estará a garantia reflexamente estendida por prazo indeterminado. E somente será interrompida a garantia no momento em que a posse do objeto da locação for restituída à parte locadora, seja em função da entrega das chaves ao locador, seja em razão da imissão na posse do imóvel locado ou de seu respectivo despejo.

Como terceira, e última, situação possível para o caso em estudo, em sendo pactuada a garantia por prazo indeterminado desde o início da locação, a cessão fiduciária em garantia restará vinculada ao tempo de vigência do contrato de locação, isto em função de sustentar posição de contrato acessório, instrumento este conectado intimamente ao contrato garantido, o principal, de sorte que o cedente-devedor permanecerá responsável pelo cumprimento das obrigações contratuais até a data na qual a posse do prédio locado seja restabelecida ao locador.

Dentro deste contexto, importante destacar que, quando o cedente (agente responsável por ceder as quotas em garantia) não for o próprio locatário, mas for terceira pessoa, deverá esta ratificar o contrato de locação, na qualidade de garantidor, conforme prevê o enunciado do § 2°, do artigo 88, da Lei 11.196/2005. Aplicando raciocínio reverso ao dispositivo em exame, compreendemos que, figurando também o locatário como garantidor, isto é, sendo ele o próprio cedente das quotas, tornar-se-á dispensável o par de assinaturas, pois a cessão fiduciária de quotas será contratada no ato da assinatura do contrato de locação, neste instrumento ou em contrato apartado.

Ante o exposto, evidencia-se que o procedimento de cessão da titularidade das quotas, inicialmente transferirá a propriedade sobre estas tão somente caráter resolúvel, o que significar dizer que a titularidade do locador sobre as quotas estará subordinada a uma condição resolutiva, isto é, que poderá ser levada a termo no caso desta condicionante ser alcançada, fato este que fará com que a titularidade sobre as quotas retorne do locador para o locatário ou terceiro.

Em vista do caráter resolúvel ora em comento, as quotas que foram transferidas e cedidas em garantia, ficarão sob a propriedade do locador pelo prazo em que o contrato de locação viger, a fim de que este, através de procedimento próprio - que será abordado mais adiante -, possa utilizá-las como meio de solver débitos oriundos da relação ex locato e provenientes do descumprimento dos deveres locatícios pelo locatário.

Por conseguinte, em referência às locações de imóveis urbanos, considera-se como condição resolutiva o término da relação contratual estabelecida entre os contratantes, locador e locatário, independentemente do modo e do motivo, se por denúncia, se em decorrência da prática de infração legal ou contratual, dentre outros. Todavia, ressalvamos, desde logo, que os efeitos desta condição somente serão operados em favor do locatário quando este, tendo cumprido integralmente as obrigações firmadas no contrato de locação, estiver em dia com seus deveres contratuais, não podendo haver quaisquer pendências de caráter financeiro ou obrigacionais que resultem em consequências patrimoniais negativas em desfavor do locador.

Em ocorrendo, pois, o término da relação locatícia e estando o locatário inadimplente com alguma ou algumas obrigações e/ou havendo pendências oriundas do contrato de locação, as quotas não retornarão para a titularidade do locatário, ou de terceiro cedente, mas permanecerão sob a propriedade do locador pelo o motivo informado e para o fim destacado anteriormente, em vista da mora do locatário.

Fundamentado na doutrina civilista atual, a mora poderá ser qualificada como suportável ou insuportável, isto a critério do locador, por questões de conveniência e oportunidade, sendo este o agente que determina o limite tolerável para o atraso no cumprimento das obrigações contratualmente estabelecidas para o locatário.

Destarte, com escopo nos §§ 6° e 7°, da Lei 11.196/2005, na situação em que o locatário estiver em mora, ou seja, quando este não tiver efetuado o pagamento ou cumprido a obrigação no tempo, no lugar ou na forma convencionada entre as partes no contrato de locação, entendemos ser dois os caminhos pelos quais poderá o locador percorrer.

O primeiro deles, desenvolver-se-á na esfera extrajudicial, situação em que deverá o locador notificar extrajudicialmente o locatário (ou, na hipótese de terceiro ser o cedente das quotas, ambos), comunicando o prazo de dez dias para quitação integral da dívida, sob pena de, em caso de descumprimento, ser promovida a excussão extrajudicial da garantia locatícia.

Assim, transcorrido o prazo sem que tenha havido o pagamento do débito, o locador, mediante requisição à instituição financeira responsável pela administração do fundo, solicitará a transferência das quotas ofertadas em garantia, quantas bastem para solver a obrigação pendente, restando limitada à quantia cedida em garantia. Sob este prisma, entendemos que, não sendo as quotas suficientes para suprir o valor total da dívida, poderá o locador, pelos meios próprios e, agora, judicialmente, penhorar outros bens do locatário, buscando satisfazer seu crédito, não podendo serem atingidos outros bens do cedente, senão aqueles concedidos em cessão fiduciária, caso seja este pessoa distinta da do locatário, em vista da responsabilidade estar circunscrita aos valores mobiliários que foram cedidos em garantia ao cumprimento das obrigações locatícias.

Nessa sentido, a propriedade sobre as quotas, que, no momento inicial da locação, quando estas foram ofertadas para garantir eventuais débitos e transferidas provisoriamente para o locador, apresentava caráter resolúvel, serão transferidas plenamente para este, por intermédio do cumprimento da excussão extrajudicial, e em caráter exclusivo e irrevogável, tornando-se parte de seu patrimônio.

Em vista do exposto, salientamos que o artigo 1365, caput e parágrafo único, do Código Civil, não tem aplicação prática na hipótese em que a cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento for instituída como modalidade de garantia locatícia, pois, do contrário, se inviabilizaria a efetividade desta garantia, a qual resulta da transmissão das quotas do fundo de investimento ao credor nos casos em que ocorrer inadimplemento por parte do locatário, sem que, para isto, haja a necessidade de manifestação por parte do Poder Judiciário, tornando, por assim ser tratada, a cessão fiduciária em garantia mais atrativa para os locadores.

Ademais, concluída a transferência das quotas do fundo de investimento para o locador, nas condições descritas anteriormente, poderá este, ainda, promover a respectiva ação de despejo, visando, em definitivo, resolver a relação contratual e reaver o imóvel locado para si, além de poder demandar, por via de ação de execução, o locatário pela diferença que, porventura, possa existir, na hipótese em que a garantia oferecida pelo locatário se mostre insuficiente face ao valor da dívida.

Já o segundo caminho que poderá ser percorrido pelo locador, é trilhado na esfera judicial diretamente. Neste caso, ao locatário é concedido o direito purgar a mora, podendo, inclusive, manter vigente o contrato de locação, conforme encontra-se previsto no inciso II e seguintes, do artigo 62, da Lei 8.245/1991. Ressalta-se, por oportuno, que optando o locador por demandar judicialmente o locatário pelo inadimplemento ou descumprimento contratual, somente poderá realizar a excussão das quotas cedidas em garantia extrajudicialmente após ter transcorrido o prazo para purgação da mora. Todavia, não ficará o locador impedido de buscar a penhora das quotas do fundo de investimento, valendo-se, para tanto, do procedimento referente ao cumprimento de sentença.

Dada a relevância do ato expropriatório e em razão de ser considerado uma violência patrimonial legalmente instituída, mas, em boa parte das casos, deveras necessária, houve por bem o legislador, objetivando coibir quaisquer condutas fraudulentas por parte do locador, ou do conluio formando entre este e o gestor do fundo de investimento, almejando se beneficiar do patrimônio alheio sem que haja, para tanto, situação de inadimplência pendente, destacar categoricamente a responsabilidade do locador, quando este promover a excussão extrajudicial de forma indevida, pelo prejuízo que causar ao locatário, ou terceiro cedente, sendo obrigado também a proceder com a devolução das quotas, ou do valor correspondente atualizado, conforme prescrito no § 8°, do artigo 88, da Lei 11.196/2005.

Dentro deste contexto, de acordo com o § 9°, deste mesmo artigo, a instituição financeira somente responderá pelos prejuízos dispostos nos parágrafos mencionados acima, nas hipóteses em que houver comprovado dolo, má-fé, simulação, fraude ou negligência, no desempenho da administração do fundo de investimento, situações nas quais sua responsabilização estabelecer-se-ia somente quando sua performance fosse qualificada como culposa latu senso, sendo prestigiada, deste modo, a teoria da responsabilidade subjetiva.

Já em se tratando da hipótese em que ocorrer a prorrogação automática do contrato de locação, prevista no § 5°, em sendo o cedente terceira pessoa distinta da do locatário, permanecerá responsável por todos os efeitos provenientes da relação ex locato pelo prazo que perdurar a relação ex locato, independentemente de manifestação de concordância positiva para tanto em eventual aditivo. Por oportuno, recomendamos que seja consignado no bojo do contrato de locação a presente situação, no sentido de documentar a prorrogação da cessão fiduciária em garantia quando ocorrer a dilação do prazo do contrato de locação, buscando, desta maneira, minimizar entendimentos e vertentes que coloquem em situação sensível a manutenção da garantia contratada.

Todavia, ressalva a Lei, que ao cedente é garantido o direito de exonerar-se das responsabilidades advindas da garantia ofertada, a qualquer tempo, devendo ser promovida por via de notificação endereçada ao locador, ao locatário e à administradora do fundo de investimento - quando o cedente for pessoa distinta da do locatário -, devendo ser respeitado o prazo de antecedência mínimo de trinta dias. E, neste caso, visando dar continuidade à locação firmada com o locador, caberá ao locatário oferecer nova garantia, sob pena de, em caso negativo, incidir em descumprimento contratual, que poderá culminar em ação de despejo, promovida esta pelo locador, e com efeitos liminares, de acordo com a previsão do artigo 59, § 1°, inciso VII, da Lei 8.245/1991.

Sobre esta temática, nos parece desarrazoado validar o ato de exoneração do garantidor quando o garantido estiver em mora com suas obrigações locatícias. Portanto, nas situações em que o locatário não estiver em dia com seus respectivos deveres, advogamos no sentido de que não poderá o cedente exonerar-se das responsabilidades oriundas do contrato de locação, sob pena de, no momento em que for necessário excutir a garantia para o fim de solver eventual dívida, se deparar o locador com uma garantia ineficiente.

Derradeiramente, tendo como base o artigo 40 da Lei do Inquilinato, dispositivo no qual constam o rol de situações nas quais poderá o locador exigir do locatário a substituição da modalidade de garantia firmada no contrato de locação, nota-se que, com a promulgação da Lei 11.196, de 21 de Novembro de 2005, ao artigo em destaque foram incluídas as situações dispostas nos incisos VIII e IX, respectivamente. Logo, com o advento desta modalidade de garantia contemporânea ao rol das garantias locatícias clássicas, ato contínuo houve por bem o legislador constituinte determinar regramento próprio para os casos em que a cessão de quotas de fundo de investimento tornar-se inócua.

Nesse sentido, tais inovações jurídicas possibilitaram ao locador, nos casos em que ocorrer a exoneração de garantia constituída por quotas de fundo de investimento (inciso VIII) ou houver a liquidação ou encerramento do fundo de investimento, gestor das quotas que foram cedidas a título de garantia, com base no artigo 37, inciso IV, da Lei 8.245/1991 (inciso IX), requerer do seu inquilino a substituição da proteção contratualmente estabelecida pelas partes, sob pena de, caso seja do interesse do locador, ser resolvida a relação ex locato, sem prejuízo das demais penalidades previstas no instrumento de locação.

1 - A Comissão de Valores Imobiliários (CVM), instituída pela Lei 6.385, de 7 de Dezembro de 1976, com sede no Rio de Janeiro, é uma autarquia ligada ao Ministério da Fazenda da União, responsável por normalizar, fiscalizar e disciplinar, o mercado de valores mobiliários e seus respectivos integrantes.

Rubens Van Moorsel Filho - Advogado, Professor, Corretor de Imóveis e Perito Judicial, especializado em Direito Imobiliário.
Fonte: Van Moorsel Advogados

quinta-feira, 5 de abril de 2018

A RESCISÃO DO CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL E A SÚMULA 543 DO STJ



Nos dias atuais, principalmente diante da situação econômica experimentada pelo Brasil, um dos principais problemas vividos pelo comprador de imóvel na planta diz respeito à rescisão do compromisso de compra e venda, conhecido como distrato.

Verificada a grandiosa ocorrência de demandas envolvendo a compra e venda de imóvel, a 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 543, regulamentando como deve ser a decisão judicial sobre a rescisão nos contratos de compra e venda de imóveis. A propósito, veja-se:

“Súmula nº 543 do STJ - Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador – integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento”(grifei).

A súmula consolida aquilo que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já vinha decidindo, trazendo importante discussão acerca da impossibilidade de retenção de valores por parte das construtoras ou incorporadoras, na hipótese de rescisão contratual por sua culpa exclusiva (atraso na entrega da obra, por exemplo).

Por sua vez, a súmula deixa em aberto o percentual a ser restituído em caso de desistência do comprador, ao estipular que: “Ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento”.

Respeitando aqueles que pensam de forma diversa, entendemos que, quando a desistência ocorre em razão de culpa do comprador (impossibilidade de continuar com o pagamento, por exemplo), a construtora tem o direito de reter apenas e tão somente 10% dos valores efetivamente pagos, uma vez que o imóvel poderá ser comercializado novamente.

Aliás, diferente não é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

“CIVIL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. RESCISÃO. DEVOLUÇÃO DE PARCELAS PAGAS. PROPORCIONALIDADE. CC, ART. 924. I - A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça está hoje pacificada no sentido de que, em caso de extinção de contrato de promessa de compra e venda, inclusive por inadimplência justificada do devedor, o contrato pode prever a perda de parte das prestações pagas, a título de indenização da promitente vendedora com as despesas decorrentes do próprio negócio, tendo sido estipulado, para a maioria dos casos, o quantitativo de 10% (dez por cento) das prestações pagas como sendo o percentual adequado para esse fim. II - E tranquilo, também, o entendimento no sentido de que, se o contrato estipula quantia maior, cabe ao juiz, no uso do permissivo do art. 924 do Código Civil, fazer a necessária adequação” (STJ; AgRg no REsp 244.625/SP; relator ministro Antônio de Pádua Ribeiro; julgado em 9/9/2001 — grifei).

Assim, na primeira situação, caso a culpa pela rescisão do contrato seja exclusivamente da construtora ou incorporadora (hipóteses como atraso no prazo de conclusão e entrega, problemas apresentados pelo imóvel etc.), fica estabelecida a restituição de todo o valor pago pelo comprador, de uma só vez, com juros e correção monetária. Ainda, na hipótese de atraso na entrega da obra, perfeitamente possível existir pedido de indenização por danos morais e materiais, conforme análise do caso em concreto.

Na segunda situação, caso a rescisão do contrato de compra e venda ocorra por culpa exclusiva do comprador (hipóteses como arrependimento na compra, negativa de financiamento pelas instituições financeiras, dificuldade no pagamento das parcelas etc.), a construtora ou incorporadora poderá reter parte do valor pago para ressarcir as despesas administrativas, tais como corretagem e assessoria “sati”, publicidade e outras. Nesse sentido, os tribunais têm reconhecido como abusiva a cláusula que prevê retenção maior do que 10% do valor efetivamente pago pelo comprador.

Registre-se, por fim, que a citada súmula é aplicável apenas nos casos em que há aplicação das normas previstas no Código de Defesa do Consumidor.

Antonio Marcos Borges da Silva Pereira
Fonte: Revista Consultor Jurídico

terça-feira, 3 de abril de 2018

O INVENCÍVEL MITO DA FRAÇÃO IDEAL NA INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA



Quando escrevi aqui* sobre a confusão envolvendo a gênese do condomínio edilício, prometi tratar, depois, da fração ideal.

E faço isso porque, ainda hoje, continuo lendo e ouvindo, de muitos condôminos, administradores, empresários, advogados, notários, registradores, promotores e magistrados, que a fração ideal, na incorporação imobiliária, deve ser calculada de acordo com a fórmula prevista na NBR 12.721, elaborada pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), e que guarda relação com o tamanho da unidade autônoma.

Para mim, entretanto, isso é tão verdadeiro quanto a antiga afirmação de que beber leite com manga pode matar.

Ao contrário do que muitos supõem, a fração ideal não tem, juridicamente, relação com o tamanho da unidade imobiliária. Nada. Um apartamento de 200m² pode, sem nenhuma ilegalidade, ter uma fração ideal menor que outro de 100m², no mesmo condomínio. O fato disso ser incomum revela apenas o que pretendo demonstrar com este breve texto: calcular a fração ideal segundo a NBR 12.721 é um hábito do incorporador brasileiro; e está longe de ser uma obrigação.

Fração ideal, parte ideal, cota parte, ou como queiram chamar, significa a quantidade de propriedade que o titular da unidade tem nas partes comuns do condomínio. Se ao apartamento "x" de um dado prédio corresponde a fração de 0,05 (ou 1/20), isso significa dizer que seu titular tem 5% do terreno e das demais partes comuns. Se o prédio ruir e a assembleia geral decidir vender o terreno com o que sobrou, esse condômino fará jus a 5% do preço. Quanto a isso, funciona exatamente igual ao condomínio voluntário (ou ordinário), onde tudo é coisa comum: quanto maior a fração, maior a fatia de propriedade de seu titular.

Reparem que nem mesmo com relação às despesas existe a obrigação de correspondência. O art. 1.336, I, do CC, estabelece que o condômino participará do rateio das despesas de acordo com sua respectiva fração ideal, salvo se a convenção estabelecer outro critério. Idem para a votação (art. 1.352, p. único).

Então, é importante saber que estamos diante de três conceitos juridicamente autônomos entre si: fração ideal, área privativa da unidade, e coeficiente de rateio de despesas. Eles podem ou não coincidir, a depender da vontade do instituidor (criador) do condomínio e da respectiva convenção.
Na legislação brasileira, a fração ideal de cada unidade era, até julho/2017, regulada por três dispositivos:

(i) o art. 32, "i", da lei 4.591/64, que trata do memorial de incorporação, exige que uma das informações a serem apresentadas ao cartório de Registro de Imóveis seja a "discriminação das frações ideais de terreno com as unidades autônomas que a elas corresponderão";

(ii) o art. 1.332 do CC (lei 10.406/02) estabelece que o condomínio edilício é instituído por ato entre vivos registrado no cartório de Registro de Imóveis, "devendo constar daquele documento" ... "a determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, relativamente ao terreno e partes comuns"; e

(iii) o art. 1.331 do mesmo CC dispõe, em seu §3º, que a "cada unidade imobiliária caberá... uma fração ideal no solo e nas outras partes comuns, que será identificada em forma decimal ou ordinária no instrumento de instituição do condomínio".

Com a entrada em vigor da lei 13.465/17, o CC ganhou o art. 1.358-A, cujo parágrafo 1º estabelece que "a fração ideal de cada condômino poderá ser proporcional à área do solo de cada unidade autônoma, ao respectivo potencial construtivo ou a outros critérios indicados no ato de instituição". Lógico! E isso deveria tornar este artigo inócuo, pois, muitos dirão, com razão: agora a lei, que já não engessava o critério de cálculo da fração, é expressa em enunciar a liberdade do instituidor do condomínio! Que nada. A ligação psicológica fração-área é enraizada tão profundamente que haverá alguém dizendo que isso é a prova do contrário! Sob a força do viés de confirmação, argumentar-se-á que, estando a regra na Seção IV, só o incorporador de condomínio de lotes desfrutaria dessa autonomia. Aliás, será que o legislador incluiu o parágrafo pensando em evitar a polêmica, ou será que ele próprio quis abrir uma desnecessária exceção? Errou em qualquer caso. E como podem ver, a novidade não enterra a celeuma.

Pois bem. Notem que nenhum dos três dispositivos estabelece um modo de cálculo da fração ideal, limitando-se a exigir: (i) que toda unidade condominial tenha uma fração; e (ii) que a fração deverá ser representada em forma decimal ou ordinária.

O art. 1.331, §3º, do CC, na verdade é uma repetição do que já existia na lei 4.591/64, cujo artigo 1º, §3º, revogado pelo CC, já dispunha que "a cada unidade caberá, como parte inseparável, uma fração ideal do terreno e coisas comuns, expressa sob forma decimal ou ordinária".

Vejam, portanto, que a liberdade no cálculo da fração ideal já vigorava desde o ano de 1964, exceto por um breve período de interrupção. A redação original do art. 1.331, §3º, do CC, que entrou em vigor em janeiro/2003, previa que "a fração ideal no solo e nas outras partes comuns é proporcional ao valor da unidade imobiliária, o qual se calcula em relação ao conjunto da edificação".

Essa obrigatoriedade de calcular a fração de acordo com o valor da unidade a ela correspondente foi tão mal recebida que um ano depois o dispositivo foi alterado pela lei 10.934/04, valendo a atual redação, que trouxe de volta a discricionariedade no cálculo.

Em resumo, a cronologia legal foi a seguinte:
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A Lei de Incorporações, no art. 32, ao tratar do memorial descritivo (alínea "e"), exige que ele seja feito "conforme modelo a que se refere" o art. 53, IV, da mesma lei. Idem para a avaliação do custo global da obra (alínea "h"), que deve ser calculada "de acordo norma do inciso III, do art. 53".

O artigo 53, acima referido, estabeleceu, na época, que o então Banco Nacional da Habitação celebraria contratos com a ABNT, a fim de criar os modelos indicados no art. 32.

Esses modelos, atualmente, constam, como já dito antes, da NBR 12.271 publicada pela ABNT. O incorporador deve, obrigatoriamente, seguir os modelos ali dispostos quanto ao custo global da obra e ao memorial descritivo. Porém, não há obrigatoriedade de se utilizar a referida NBR para o cálculo da fração ideal.

Na prática, os incorporadores geralmente (mas nem sempre!) atribuem às frações ideais os mesmos valores dos "coeficientes de proporcionalidade" que a aludida NBR fornece.

O importante a se ter em mente, entretanto, é que tais coeficientes não correspondem, juridicamente, às frações ideais. Essa equivalência surge de uma opção do próprio incorporador, não apenas por comodidade (os programas baseados na NBR disponibilizam os valores automaticamente), mas também pelo hábito de pensar que a fração ideal, naturalmente, deve ser razoavelmente proporcional à área privativa da unidade.

Portanto, não se deixem iludir: do ponto de vista jurídico, não há proporção obrigatória entre cota-parte e tamanho da unidade imobiliária, e o incorporador tem liberdade para fixar as frações conforme o critério que lhe seja mais conveniente. E que esse mito capaz de impedir, em certos casos, o desenvolvimento de interessantes estruturas condominiais, possa ser aos poucos, e completamente, suplantado. Quem sabe um dia?

André Abelha - Sócio do escritório Castier/Abelha Advogados.
Fonte: Migalhas de Peso