segunda-feira, 29 de agosto de 2016

MERCADO IMOBILIÁRIO RECESSIVO E AS SOLUÇÕES CONTRATUAIS PARA NOVOS NEGÓCIOS



Segundo o criador da Teoria da Relatividade, o físico alemão Albert Einstein, “A crise é a melhor benção que pode ocorrer com as pessoas e países, porque a crise traz progressos”. Tal declaração, sobremodo em contextos desgastados por modelos ultrapassados de gestão, provavelmente poderá acender expectativas naqueles que como bons brasileiros “não desistem nunca”.

No ambiente da Construção Civil, seja pelos altos riscos diretamente decorrentes da produção ou pela demanda expressiva de aportes financeiros, parece que a situação se afigura ainda mais agravada. É que além de exigir muito tempo para que se configure o ciclo operacional, com a entrega e recebimento do preço do produto, a atividade passa por etapas que vão desde o planejamento da compra e regularização do terreno, registros públicos, licenças municipais (e mistas, no caso do Meio-Ambiente), captação de fontes de financiamento, execução da obra e regularização e entrega da propriedade imobiliária.

A tudo isso se soma o alto detalhamento da Legislação Tributária, aplicada de maneira específica ao setor, da interpretação atualizada do Código de Defesa do Consumidor na hora de confeccionar e celebrar contratos, e até mesmo das Normas de Segurança do Trabalho, constantemente atualizadas e ampliadas.

Neste cenário, a boa nova é que o incremento de arranjos empresariais tem servido como meio competitivo para que o fluxo de capital e de novos negócios não seja paralisado. A solução para muitos tem se dado através da modelagem de estruturas negociais, em sua maioria fundadas na relação de parceria e na somatória de escopos financeiros, tecnológicos e intelectuais, garantindo a viabilização de produtos rentáveis para investidores, empreendedores e adquirentes.

Dentre os principais formatos utilizados, três formas merecem destaque: a primeira delas diz em relação à utilização das denominadas Sociedades de Propósito Específico – SPE – ou SPC (Specif Purpose Company), do Direito Norte-Americano -, que é forma de organização empresarial modernamente prevista na Lei Civil brasileira, cujo principal característica consiste na segmentação do patrimônio empresarial e na limitação da responsabilidade dos envolvidos. O que diferencia uma SPE das demais sociedades empresárias é o seu objeto específico, ou seja, a pessoa jurídica é constituída e tem tempo de existência vinculado à realização de um ou mais projetos antecipadamente anunciados. Quanto ao aspecto tributário, existe a possibilidade da implementação de estratégias tributárias que favoreçam a carga tributária, mas que está condicionada a possibilidade de afetação do patrimônio.

O segundo modelo, normalmente utilizado nas situações em que existam entraves burocráticos relevantes ou altos custos na contratação do capital para financiar a regular evolução da obra, é o previsto no artigo 58 da Lei de Incorporações, que prevê que ”Nas incorporações em que a construção for contratada pelo regime de administração, também chamado “a preço de custo”, será de responsabilidade dos proprietários ou adquirentes o pagamento do custo integral de obra”. São estas as hipóteses em que o Incorporador limita-se, quase que exclusivamente, ao papel de condutor do projeto, cuidando da aquisição de terrenos bem localizados e neles incorporando projetos imobiliários atraentes, cujas obras serão financiadas diretamente pelos adquirentes. Neste modelo, além de outros aspectos de idêntica relevância, o certo é que ao evitar-se a incidência da carga tributária “em cascata”, estaremos diante de uma relação “custo x benefício” atraente para adquirentes e empreendedores.

Finalmente, e conforme prelecionado pela Lei Federal Nº 10.931/2004, que alterou a Lei de Incorporações nº 4.591/64, a utilização da dinâmica do Patrimônio de Afetação é outra forma de arranjo negocial que, muito embora pouco utilizada pelos empreendedores, além de abrigar outros benefícios, garantem a blindagem patrimonial, a facilidade na captação de recursos para financiamento, a redução relevante da carga tributária envolvida e a segurança do capital aplicado. Tais fatores – ressalte-se –, além dos benefícios promovidos por si mesmos, se prestam como elementos de destaque e diferencial mercadológico na hora das vendas, neutralizando fatores a exemplo da eventual desconfiança de muitos na hora de investir.

Negócios complexos e de longo prazo que são a aplicação de tais formas no Setor Imobiliário denota em vantagens e pontos sensíveis, sendo importante que além dos contornos contratuais jurídicos implementados caso a caso, o empreendedor esteja atento ao correto cumprimento das obrigações instrumentais relativas às contribuições previdenciárias, cujo recolhimento insuficiente ou em simples equívoco na atribuição de “códigos de recolhimento”, poderão resultar em transtornos sérios no momento da averbação da obra que antecede a entrega das unidades aos consumidores.

Cláudio Silva - Advogado
Fonte: Artigos JusBrasil

segunda-feira, 22 de agosto de 2016

ALTERAÇÃO DA FACHADA NOS CONDOMÍNIOS EDILÍCIOS: LIMITES E ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL



1 - INTRODUÇÃO:

As modificações da fachada dos condomínios edilícios podem causar várias dúvidas perante a sociedade, bem como problemas, tanto para o condomínio quanto ao condômino. Esse é um tema polêmico, com recorrente apreciação do Poder Judiciário, na qual esperamos melhor destrinchá-lo.

O respectivo trabalho envolve um estudo sobre o que o nosso ordenamento jurídico estabelece e o que o Poder Judiciário e os condomínios vêm realizando na prática. Na simples leitura do artigo 1336, III do Código Civil de 2002, fica claro que qualquer alteração de fachada não pode ser realizada salvo com a concordância da unanimidade dos condôminos. No entanto, cabe-nos analisar também os limites de tal dispositivo, e se tal prática não estaria violando a legislação como um todo, tal como a lei geral sobre condomínios edilícios, o Código Civil, compreendido entre os artigos 1331 a 1358, como também a Lei 4591/64, além dos códigos ou leis que regulem posturas públicas dos municípios ou mesmo legislação no âmbito estadual.

Sem a pretensão de esgotar o assunto, neste artigo a questão da mudança da fachada nos condomínios edilícios é abordada tendo como referência somente a jurisprudência, dispositivos de leis que serão trazidos a tona para a melhor compreensão do leitor, bem como a melhor doutrina sobre o tema.

2 - FACHADA E SEUS LIMITES: UMA ANÁLISE DOUTRINÁRIA E JURISPRUDENCIAL MODERNA.

É sabido na concepção de condomínio edilício que temos por uma das características, a conjugação de direitos reais, tal qual o direito de propriedade exclusiva que consiste no exercido pelo condômino sobre sua unidade autônoma, e pelo direito de co-propriedade, na qual é exercido conjuntamente por todos os condôminos em áreas comuns. Tais direitos supracitados, impõe aos condôminos a observância de certos deveres:

Como dito introdutoriamente, temos em vigor o artigo 1.336, do Código Civil de 2002, cujo enumera de forma não taxativa, os deveres mínimos dos condôminos, estipulando em seu inciso III que é vedada a alteração da forma e a cor da fachada, das partes e esquadrias externas. In verbis:

Art. 1.336. São deveres do condômino:

III – não alterar a forma e a cor da fachada, das partes e esquadrias externas; [i]

Em nossa pesquisa, nota-se que tal dispositivo resta por demasiadamente ampla em relação a sua interpretação. A norma aqui pende a uma valoração axiológica do magistrado, na qual deve ser analisada conforme o caso concreto, gerando assim, uma jurisprudência farta sobre o tema, devido a quantidade de condôminos buscando a tutela jurisdicional e a interpretação variada dos jurisdicionados.

Antes mesmo de adentrar na análise, jurisprudencial, na qual tem como base do respectivo estudo, comentando o dispositivo, ora citado acima, trazemos para o leitor, o conceito de fachada e seu objetivo, por dois grandes doutrinadores no ramo.

Nos ensinamentos de Caio Mario da Silva Pereira que:

“(...) a fachada do edifício é um bem comum a todos os co-proprietários, e, como tal, não pode qualquer condômino nela inovar sem o consentimento dos demais. A aplicação dessa proibição converte-se em dever de todos os condôminos quanto a conservação das linhas exteriores do prédio”[ii].

Flávio Tartuce ainda esclarece que:

“(...) a proibição de alteração de fachada tem por objetivo a manutenção da harmonia estética do edifício”. Adiante, o autor traz à baila que “a alteração que em nada implique comprometimento dessa harmonia arquitetônica não é considerada infração (…)” [iii]

Ante exposto, é claro que a proibição atribuída aos condôminos refere-se à área externa do edifício. Conforme interpretação hermenêutica à esse ponto, entendemos que, por se tratar de regra restritiva, deve ser interpretada restritivamente. Por fim, conforme próprio ensinamento do autor ora citado, a limitação restringe-se ao conjunto arquitetônico da construção, isto é, refere-se a proibições de alterações na fachada do prédio. Consiste, pois, em uma limitação estética no interesse da coletividade condominial.

Assim, conforme trás em análise Guglinski, a vedação à alteração da fachada ao alvedrio dos condôminos é de suma importância para que a edificação não se torne uma pintura abstrata, sem formas e cores definidas. A regra geral, portanto, é a de que é defeso aos condôminos empreender modificações nas fachadas sem o consentimento dos demais. Uma vez introduzidas tais alterações por um ou alguns dos condôminos ao arrepio das regras contidas na Convenção ou na Lei, cabe ao síndico ou qualquer condômino ajuizar ação de nunciação de obra nova para impedir seu prosseguimento ou ação demolitória caso a mesma já esteja concluída.[iv]

Entende-se, todavia, que a análise do dispositivo em comento depende de cada caso concreto, sendo que modernamente entende-se que as modificações realizadas pelos proprietários que não afetem a harmonia do edifício, nem causem prejuízos aos co-proprietários, sejam permitidas.

3. ALTERAÇÕES DE FACHADA: UMA NOVA CONCEPÇÃO JURISPRUDENCIAL DA ESTRUTURA URBANÍSTICA.

Aqui, tratar-se-á dos mais comuns tipos de alteração de fachada, sem a pretensão de esgotar todos as espécies de alterações, mas seguindo a perspectiva geral quanto as mudanças de fachada trabalhada em tópico a cima e trazendo posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais, esperamos buscar melhor entendimento do leitor, para por fim trazer em seguida a construção histórica dessa jurisprudência, bem como, possíveis soluções para quem convive com estas questões a seguir trabalhadas:

3.1 – ENVIDRAÇAMENTO OU REDES DE PROTEÇÃO:

No sentido de mudança de fachada, podemos citar como exemplos a colocação de redes de proteção nas janelas da unidade residencial ou o envidraçamento das varandas ou sacadas. É cada dia mais normal as construções de apartamentos residenciais com sacada “gourmet”, assim como, apartamentos decorados onde estas sacadas são apresentadas com o referido envidraçamento.

Porém, muitos condôminos, após o recebimento do respectivo imóvel, são impossibilitados de realizar esse envidraçamento, sob o argumento que o envidraçamento configura alteração da fachada, o que nos leva a um julgado recente do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, nos autos da apelação n.º 0029009-21.2011.8.26.0002, de Relatoria do Eminente Desembargador Fortes Barbosa, decidiu que:

“(...) instalação de vidros incolores e imperceptíveis, não importam em alteração considerável da fachada, vedada pelas normas condominiais e pelo artigo 10, inciso I da Lei n.º 4561/64 e pelo artigo 1336, inciso II do Código Civil.” [v]

Tal Tribunal entendeu que a instalação de vidros incolores e o emprego de perfis de alumínio leve não alteraram em nada a fachada do prédio, ficando preservadas as intenções formais e de acabamento do projeto inicial. No mesmo acórdão, concluiu-se, que o envidraçamento não quebra a harmonia arquitetônica e, inclusive, melhora na funcionalidade e no aproveitamento da sacada com maior segurança.

No mesmo sentido, Caio Mário da Silva Pereira:

“Tem-se entendido, generalizadamente, que não importa em alteração interdita o fechamento de área voltada para o exterior, varanda ou terraço, por vidraças encaixilhadas em esquadrias finas, de vez que a sua transparência não quebra a harmonia do conjunto” [vi]

3.2 - IMPLEMENTAÇÃO DE LETREIROS, PLACAS E LUMINOSOS:

Outra questão que é de suma importância, e relaciona-se com o tema, diz respeito à implementação pelos condôminos de letreiros, placas, luminosos quando for omissa a convenção de condomínio.

Marco Aurélio Viana nos ensina que:

“(...) a colocação de letreiros luminosos na fachada, em se tratando de prédio comercial, não conhece obstáculos, observado igual direito dos demais comunheiros. (...) Já em prédio residencial não se admite a utilização da fachada da forma indicada. A colocação de painel de propaganda em fachada de edifício, traz prejuízo para outro condômino, tipifica esbulho e autoriza o manejo de interdito possessório” [vii]

Quanto aos prédios comerciais, temos que a colocação de letreiros ou luminosos pode ser considerado até mesmo como pressuposto de manutenção do negócio razão pela qual deve ser tolerado o uso de placas de identificação do estabelecimento, desde que estejam em consenso com a jurisprudencial, na qual consiste em obedecer o traçado arquitetônico e visual da edificação, respeitando também as dimensões condizentes com o espaço disponível, mantendo um padrão habitual da região e estejam de acordo com as normas e diretrizes elaboradas pela municipalidade.

Nesse sentido: Se a Convenção do Condomínio prevê expressamente a proibição de alteração, modificação, substituição ou retirada das partes de uso comum, senão mediante consentimento expresso dos condôminos, tal disposição deve ser respeitada, ainda que se trate de edifício comercial. [viii]

3.3 - INSTALAÇAO DE AR CONDICIONADO

Há divergência sobre o tema, assim como em todo o decorrer encontramos, jurisprudência em ambos sentidos sobre a colocação de aparelhos de ar condicionado em uma unidade isolada.

Uma primeira corrente afirma que tal modificação constitui alteração de fachada e o condomínio pode contestá-la na Justiça se entender que a medida desvaloriza os apartamentos por afetar a estética do edifício.

Corrente diversa diz que por se tratar de um objeto que proporciona um melhor conforto ao morador, isso não há de se contestar. No entanto extrai-se dos Tribunais Superiores que para se instalar aparelhos de ar condicionado é necessário as seguintes condicionantes:

a) Edificação deve possuir capacidade elétrica para suportar a carga suplementar decorrente da instalação do equipamento em todas as unidades atestadas por engenheiro elétrico com a devida ART – Anotação Responsabilidade Técnica. [ix]

b) Os locais de instalação desses aparelhos devem ser padronizados de modo a não comprometer a estética e segurança da edificação (resistência da estrutura) ou sua fachada. [x]

c) Todos os dados e informações devem ser levados para aprovação em assembléia geral especialmente convocada para este fim. É conveniente que o condomínio, através de assembléia geral, discipline a instalação desses equipamentos, tendo em vista que os Tribunais vêm decidindo favoravelmente aos condôminos que a pleiteiam.

3.4 -– A COLOCAÇÃO DE ANTENAS DE TV

A colocação de antenas de TV do tipo “Sky” constituem alteração de fachada se o condomínio (assembléia) entender que elas prejudicam a estética do edifício. Segundo o advogado especializado em Direito Imobiliário, Plínio Hypolito, como a instalação desses equipamentos altera a fachada, é necessário que todos os condôminos estejam de acordo.

“Observo que, nos últimos meses, várias ações desse tipo têm ocorrido, para embargar obras de locação de espaços nos topos dos prédios. Muitos condomínios acabam com a vida financeira prejudicada, já que esta é uma alternativa rentável e que pode ajudar a custear a sua administração”, afirma. Caso a locação não obtenha a aprovação unânime dos condôminos, ela será considerada irregular e passível de anulação. A obra poderá ser embargada judicialmente por iniciativa de qualquer condômino”. [xi]

No entanto encontramos julgados divergentes sobre o tema:

DIREITO DE VIZINHANÇA. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. MATÉRIA PRELIMINAR. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. INÉRCIA DO APELANTE QUANTO À APRESENTAÇÃO ESPECÍFICA DE PROVAS. PRECLUSÃO RECONHECIDA. INSTALAÇÃO DE ANTENA EM ÁREA COMUM. FACHADA NÃO AFETADA. Instalação que, por não violar dispositivos da convenção condominial e do regulamento interno, dispensava aprovação em assembleia. Sentença preservada nos termos do art. 252 do Regimento Interno. APELO IMPROVIDO. [xii]

4- EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL: UMA LINHA TEMPORAL DOS TRIBUNAIS BRASILEIROS, QUANTO AO INTERESSE DA COLETIVIDADE CONDOMINIAL:

Neste tópico, adentramos mais profundamente, na relação jurisprudencial que tem por foco este artigo. O posicionamento moderno trazido em tópico anterior adveio das mudanças vividas na sociedade, na qual impuseram gradativamente abrandamento de regras, notadamente visando garantir a segurança dos condôminos, na qual é preciso para tal, um estudo mais cuidadoso, traçando uma evolução dos entendimentos sobre o tema na visão dos tribunais deste país.

A começar, colhemos um julgado de 1962 na qual ainda vigorava o decreto 5.481/28, na qual percebemos umpositivismo extremo em uma interpretação restrita da lei da época:

O acórdão impugnado pelo extraordinário decidiu que as obras que a apelada pretende fazer, incidem na proibição do decreto 5.481/1928, que veda a qualquer proprietário muda a forma externa ou a distribuição interna dos compartimentos, proibição reiterada na convenção dos condôminos. [xiii]

No entanto em meados 1970 com a entrada em vigor da lei Lei nº 4.591, de 1964, já encontramos julgados buscando o melhor convívio e aprimoramento de regras condominiais:

É defeso a qualquer condômino alterar a forma externa da fachada (art. 10, I, da Lei nº 4.591/64). A alegada violação da norma legal por parte de outros condôminos não vem em favor do condômino que apresenta defesa fundada no princípio da isonomia, pois este pressupõe a juridicidade da conduta: do ilícito não resultam direitos. [xiv]

Duas décadas depois, o entendimento que era defeso a alteração da forma externa das fachadas se mantinham, no entanto a jurisprudência era firme, em não admitir a descaracterização desta:

É defeso ao qualquer condomínio alterar a forma externa da fachada. Se as obras, ademais descaracterizam a fachada externa, devem ser desfeitas. [xv]

No mesmo viés [xvi]. Perto do século XX, com o crescimento da utilização de vidros na estética dos condomínios:

O fechamento de sacada com caixilhos finos e vidros transparentes não caracteriza ofensa ao art. 10, I, da Lei nª 4.591/64 e de norma prevista na Convenção de Condomínio, porque constatado em perícia, e até declarado pelo autor intelectual do projeto da edificação, a inexistência de quebra da harmonia arquitetônica. [xvii]

No mesmo sentido [xviii]. Uma década depois o entendimento prevalece:

CONDOMÍNIO - Obrigação de fazer - Alteração de fachada - Substituição de venezianas por vidros - Modificações insignificantes - Existência de outras unidades que também promoveram alterações - Ausência de prejuízo para a estética do edifício - Inocorrência de depreciação do condomínio - Ensinamentos doutrinários e precedentes jurísprudenciais, inclusive da Câmara - Sentença de improcedência mantida - Apelo desprovido. [xix]

Com o advindo da busca por ar condicionados nas residências, os tribunais a priori rechaçavam a sua implementação sem autorização dos demais condôminos sob o viés de:

CONDOMÍNIO - Edifício - Alteração da fachada - Colocação de ar condicionado - Prévia consulta à administração - Necessidade - Risco à segurança, à estrutura e ao equilíbrio estético - Aplicação do artigo 10, incisos I e III, e § 2º da Lei Federal n. 4.591, de 1964 - Embargos rejeitados. [xx]

Uma década depois, tal entendimento foi acertadamente desfeito:

CONDOMÍNIO — instalação de ar condicionado na parte dos fundos do prédio - inalteração na fachada - ausência de infração à convenção condominial, que não veda a instalação dos aparelhos- recurso provido.[xxi]

Feito uma análise, de alguns precedentes de várias épocas da jurisprudência nacional, temos nos dizeres da Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Elaine Harzheim Macedo, que “à estética do condomínio deve se sobrepor a segurança, a qual merece prestígio nas relações de convivência, legitimando, em juízo de proporcionalidade, a mínima alteração da fachada, o que não chega a desrespeitar a legislação e as regras condominiais”. [xxii]

Porém, existem situações em que são aceitáveis modificações, pelo fato de não serem consideradas como alteração de fachada. Para caracterizar a alteração é necessário modificar o sentido e substituir as linhas exteriores do prédio, ou seja, não comprometam a harmônica arquitetônica do condomínio.

5- O DESFAZER DA ALTERAÇÃO INCONVENIENTE: UMA SOLUÇÃO PRÁTICA A LUZ DA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS EXTRAJUDICIAIS.

E por fim, como o condomínio pode desfazer uma alteração inconveniente. Há decisões da Justiça tanto em favor do condomínio (que em geral contesta a obra de algum condômino) quanto de moradores que alteram a fachada. Muitas vezes, os condomínios perdem a ação por “negligência”, ou seja, demoram muito tempo para contestar a alteração. Para desfazer alterações inconvenientes, o síndico deve seguir alguns passos que em geral são mais eficazes sob o principio da fumaça do bom direito; [xxiii]

a) Ter reação imediata ao fato

b) O síndico tem poder de tomar medidas contra alterações de fachada sem precisar de assembléia

c) A primeira dessas medidas é notificar o infrator para desfazer a alteração ou alertando para que esta não seja feita

d) A segunda, aplicar uma multa, desde que prevista na convenção

e) Aplicar a multa prevista no Código Civil, que é de cinco vezes o valor da cota condominial

f) Discutir em assembléia se o condomínio deve ou não entrar com medida judicial contra o morador. Segundo o novo Código Civil, o quórum dessa assembléia deve ser de dois terços dos moradores, com a aprovação pela maioria simples dos presentes

g) Recorrer à Justiça, em ultima hipótese!

6- CONCLUSÃO:

Concluímos que na prática atualmente, tem sido aceitas algumas alterações nas fachadas, desde que não acarretem em prejuízo a estrutura estética e harmônica arquitetônica. Frisa-se que quando não houver comprometido à segurança ou efetuado significativa mudança da fachada, é cabível seu fechamento/alteração.

Já neste mesmo contexto em casos de alterações em fachadas, que a Jurisprudência adota como prejuízos a estrutura exterior do prédio, elas devem ser desfeitas, ou então destruídas, para que não traga dano à terceiros condôminos.

Assim é conforme analise jurisprudencial trazida ao longo deste trabalho, as modificações, tais como o fechamento de sacadas com vidros transparentes, bem como, a instalação de redes de proteção, remoção de caixilhos, colocação de persianas, fechamento de sacadas, e ainda a substituição de materiais antigos que não existem mais no mercado quando houver a necessidade de troca de esquadrias (portas), batentes e etc não constituem alteração da fachada, desde que, insistentemente repetido ao longo deste artigo: “Não comprometam a harmônica arquitetônica do condomínio”.

Ressalta-se por fim, que algumas situações, que não configurarem alteração de fachada, dar-se-á a sugestão mais viável, na qual consiste no síndico se antecipar e convocar assembléia a fim de padronizar a instalação dos vidros, persianas, remoção de caixilhos entre outros, assim entrando em bom senso dos condôminos proprietários, e diminuindo a procura do judiciário para casos já pronunciados. Esta aprovação deverá ocorrer com quórum de maioria simples, como expressa do código de processo civil atual e obrigará aos condôminos ausentes também.
 
NOTAS

[i] BRASIL. Lei 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm

[ii] PEREIRA, Caio Mario da Silva. Condomínio e Incorporações - 6ª edição, 2000. P.214

[iii] TARTUCE, Flávio. Direito Civil, v. 4: Direito das Coisas, 4ª ed. São Paulo: Método, 2012, p. 285.

[iv] GUGLINSKI, Vitor. Alteração de fachada nos condomínios e o art. 1.336, III, do CC. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3834, 30 dez. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26269>. Acesso em: 27 de maio 2016 às 18h:27min.

[v] SÃO PAULO. Tribunal de Justiça de São Paulo. Apelação Cível nº 263.697.4/3-00. Rel. Des. MOELLER, Oscarlino. Julgado em 18/02;2009. Retirado em: http://tj-sp.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/2456562/apelacao-com-revisao-cr-2636974300-sp/inteiro-teor-100949412

[vi] PEREIRA, Caio Mario da Silva. Condomínio e Incorporações - 6ª edição, 2000. p. 156).

[vii] VIANA, Marco Aurélio S., Manual do condomínio edilício. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p 57

[viii] . BRASIL, TRIBUNAL De Justiça Do Distrito Federal E Territórios. APC 2001 01 1 016936-4. Quarta Turma Cível. Julgado em: 18 de dezembro de 2003. Disponível em: http://tj-df.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/7300119/apelacao-civel-ac-169369720018070001-df-0016936-9720018070001/inteiro-teor-102319846

[ix] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Apelaçao Cível nº 39.865. SC\Relator: Amaral e Silva. Publicado no DJ de 8.601. Data: 13-10-92 PAG:07. Disponível: http://busca.tjsc.jus.br/jurisprudencia/html.do?q=condominio%20altera%E7ao%20de%20fachada%20ar%20condicionado&only_ementa=&frase=&id=AAAbmQAABAAAIygAAG&categoria=acordao. Acessado dia 08-06-2016

[x] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento nº 2014.024732-6. SC\Relator: Desembargador Substituto CARDOSO FILHO, Odson. DATA 11/09/2014. Disponível em: http://busca.tjsc.jus.br/jurisprudencia/html.do?q=condominio%20altera%E7ao%20de%20fachada%20ar%20condicionado&only_ementa=&frase=&id=AAAbmQAACAAI14TAAE&categoria=acordao. Acessado dia 08-06-2016

[xi] http://www.vivaocondominio.com.br/noticias/vida-em-condominio/instalacao-de-antenas-nos-predios-tem-de-ser-aprovada-pelos-condominos. Acessado em 11/05/2016 às 18h:28min

[xii] SÃO PAULO. Tribunal de Justiça de São Paulo - APL: 242489420098260590 SP 0024248-94.2009.8.26.0590, Relator: Donegá Morandini, Data de Julgamento: 13/12/2011, 3ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 16/12/2011). Sentença preservada nos termos do art. 252 do Regimento Interno. Dispinivel em: http://tj-sp.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/20961824/apelacao-apl-242489420098260590-sp-0024248-9420098260590-tjsp

[xiii] BRASIL. Supremo Tribunal Federal - AI: 25807, Relator: MOTTA, Candido, julgado em: 02-04-1962. Disponível em: http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/689438/agravo-de-instrumento-ai-25807

[xiv] RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Apelação 1997.001.09065. Data de Julgamento: 01/01/1970. Retirado em:

http://www.consultoriarossi.com.br/servi%C3%A7os%20online/consultar%20jurisprud%C3%AAncia/condominio-altera-fachada/

[xv] RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro - AC 11/97 - (Reg. 240997) - Cód. 97.001.00011 - 10ª C.Cív. - Rel. Des. NOGUEIRA, Mauro - J. 10.04.1997). Retirado em: http://www.consultoriarossi.com.br/servi%C3%A7os%20online/consultar%20jurisprud%C3%AAncia/condominio-altera-fachada/

[xvi] RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro – 3ª C. Cív., Ap. Cív. nº 1.036/98 - Reg. 240898 - Cód. 98.001.01036, Rel. Des. PAIVA, Wellington Jones, julg. 02.06.1998). Retirado em: http://www.consultoriarossi.com.br/servi%C3%A7os%20online/consultar%20jurisprud%C3%AAncia/condominio-altera-fachada/

[xvii] SÃO PAULO. Tribunal de Justiça de São Paulo – 9ª C. D. Priv., Ap. Cív. nº 116.497-4, Rel. Des. OLIVA, Ruiter, julg. 28.09.1999. Retirado em:

http://www.consultoriarossi.com.br/servi%C3%A7os%20online/consultar%20jurisprud%C3%AAncia/condominio-altera-fachada/

[xviii] SÃO PAULO. Tribunal de Justiça de São Paulo – 1ª C. Dir. Priv., Ap. Cív. nº 118.999-4, Rel. Des. FILHO, Erbetta, julg. 14.09.1999. Retirado em: http://www.consultoriarossi.com.br/servi%C3%A7os%20online/consultar%20jurisprud%C3%AAncia/condominio-altera-fachada/ 

[xix] SÃO PAULO. Tribunal de Justiça de São Paulo – 6ª C. Dir. Priv., Ap. nº 994.08.056911-8, Rel. Des. NOGUEIRA, Percival, julg. 04.03.2010. Retirado em http://www.consultoriarossi.com.br/servi%C3%A7os%20online/consultar%20jurisprud%C3%AAncia/condominio-altera-fachada/

[xx] SÃO PAULO. Tribunal de Justiça de São Paulo – 2ª C. Dir. Priv., Emb. Inf. nº 1.489-4, Rel. Des. PELUSO, Cezar, julg. 18.02.1997. Retirado em: http://www.consultoriarossi.com.br/servi%C3%A7os%20online/consultar%20jurisprud%C3%AAncia/condominio-altera-fachada/

xxi] SÃO PAULO. Tribunal de Justiça de São Paulo – 5ª C. Dir. Priv., Ap. nº 522.491-4/0-00, Rel. Des. A. C. Mathias Coltro, julg. 30.09.2009. Retirado em:

http://www.consultoriarossi.com.br/servi%C3%A7os%20online/consultar%20jurisprud%C3%AAncia/condominio-altera-fachada/

[xxii] RIO GRANDE DO SUL Tribunal de Justiça do Rio Grande do SUL. Apelação Cível nº Nº 70024483018. Rel. Des. MACEDO, Elaine Harzheim. Julgado em 09;05;2011. Retirado em: http://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/20143193/apelacao-civel-ac-70023936412-rs/inteiro-teor-Z0143194

[xxiii] http://dadoscontabil.com.br/v1/?p=82. Acesso em 11 de junho de 2016 às 18h:55min.

Valdir Tomasi Rosa e Flávio M. Dias Júnior - Acadêmicos de Direito
Fonte: Artigos Jus Navigandi

quarta-feira, 17 de agosto de 2016

A IMPORTÂNCIA DA REALIZAÇÃO DE LAUDOS DE VISTORIA PARA A LOCAÇÃO DE IMÓVEIS


Finda a relação negocial de locação, ocasião em que o inquilino geralmente retira seus bens do imóvel, é possível observar as eventuais avarias do local, tais como portas e janelas quebradas, pisos destruídos, e assim por diante.

De forma precipitada, o locador contata imediatamente o seu advogado (com pouca experiência prática), e juntos ingressam com a ação respectiva, pleiteando o ressarcimento pelos danos ocasionados.

Não obstante, dão de cara com o seguinte pronunciamento: “não é possível a atribuição de responsabilidade ao locatário pelas avarias existente no imóvel locado, quando o laudo de vistoria inicial não foi juntado aos autos”.

Para evitar tais situações, as imobiliárias e os locadores mais atentos têm se precavido com a realização de Laudo de Vistoria quando da entrada e da saída do imóvel pelo locatário.

Pois bem, os artigos 22 e 23 da Lei 8.245/1991 (Lei do Inquilinato) estabelecem as obrigações legais impostas, respectivamente, aos locadores e aos locatários, o que faz nos seguintes termos:

Art. 22. O locador é obrigado a:

I – entregar ao locatário o imóvel alugado em estado de servir ao uso a que se destina;

II – garantir, durante o tempo da locação, o uso pacífico do imóvel locado;

III – manter, durante a locação, a forma e o destino do imóvel;

IV – responder pelos vícios ou defeitos anteriores à locação;

V – fornecer ao locatário, caso este solicite, descrição minuciosa do estado do imóvel, quando de sua entrega, com expressa referência aos eventuais defeitos existentes;

VI – fornecer ao locatário recibo discriminado das importâncias por este pagas, vedada a quitação genérica;

VII – pagar as taxas de administração imobiliária, se houver, e de intermediações, nestas compreendidas as despesas necessárias à aferição da idoneidade do pretendente ou de seu fiador;

VIII – pagar os impostos e taxas, e ainda o prêmio de seguro complementar contra fogo, que incidam ou venham a incidir sobre o imóvel, salvo disposição expressa em contrário no contrato;

IX – exibir ao locatário, quando solicitado, os comprovantes relativos às parcelas que estejam sendo exigidas;

X – pagar as despesas extraordinárias de condomínio.

Art. 23. O locatário é obrigado a:

I – pagar pontualmente o aluguel e os encargos da locação, legal ou contratualmente exigíveis, no prazo estipulado ou, em sua falta, até o sexto dia útil do mês seguinte ao vencido, no imóvel locado, quando outro local não tiver sido indicado no contrato;

II – servir-se do imóvel para o uso convencionado ou presumido, compatível com a natureza deste e com o fim a que se destina, devendo tratá-lo com o mesmo cuidado como se fosse seu;

III – restituir o imóvel, finda a locação, no estado em que o recebeu, salvo as deteriorações decorrentes do seu uso normal;

IV – levar imediatamente ao conhecimento do locador o surgimento de qualquer dano ou defeito cuja reparação a este incumba, bem como as eventuais turbações de terceiros;

V – realizar a imediata reparação dos danos verificados no imóvel, ou nas suas instalações, provocados por si, seus dependentes, familiares, visitantes ou prepostos;

VI – não modificar a forma interna ou externa do imóvel sem o consentimento prévio e por escrito do locador;

VII – entregar imediatamente ao locador os documentos de cobrança de tributos e encargos condominiais, bem como qualquer intimação, multa ou exigência de autoridade pública, ainda que dirigida a ele, locatário;

VIII – pagar as despesas de telefone e de consumo de força, luz e gás, água e esgoto;

IX – permitir a vistoria do imóvel pelo locador ou por seu mandatário, mediante combinação prévia, de dia e hora, bem como admitir que seja o mesmo visitado e examinado por terceiros, na hipótese prevista no art. 27;

X – cumprir integralmente a convenção de condomínio e os regulamentos internos;

XI – pagar o prêmio do seguro de fiança;

XII – pagar as despesas ordinárias de condomínio.

Vê-se, pois, que não há qualquer dispositivo legal que obrigue o locador a realizar os laudos de vistoria, tampouco há previsão para a inspeção.

Portanto, o preceito utilizado como justificativa para a sua realização é o III, ipsis litteris:

III - restituir o imóvel, finda a locação, no estado em que o recebeu, salvo as deteriorações decorrentes do seu uso normal.

Há tempos a jurisprudência já vem exigindo como prova da ocorrência dos danos a juntada do laudo de vistoria inicial, realizado quando da entrada do inquilino no imóvel, sob o fundamento de que é somente por meio dele é se pode constatar em que condições o bem foi realmente entregue, para, então, compará-lo com o de desocupação.

Tal exigência tem por base a incumbência ao autor do ônus da prova quanto ao fato constitutivo do seu direito (art. 373, inciso I, do Novo Código de Processo Civil).

De igual modo, não há que se considerar o argumento de que consta no contrato de locação assinado pelas partes que o imóvel locado estava sendo recebido em perfeitas condições de uso, já que tais contratos são geralmente genéricos.

Em rápida busca à jurisprudência, é possível encontrar diversos julgados que desconhecem a obrigação de ressarcimento do locatário por ausência de provas. Colaciono abaixo o Acordão proferido pela 26ª Câmara de Direito Privado de São Paulo:

Locação - Cobrança - Ausência de laudo de vistoria inicial e final - Real estado de conservação do imóvel por ocasião da entrega das chaves não comprovado - Ônus que incumbia ao autor - Apelo improvido.

(TJ-SP - APL: 00195207120138260007 SP 0019520-71.2013.8.26.0007, Relator: Vianna Cotrim, Data de Julgamento: 17/12/2015, 26ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 17/12/2015)

Por outro lado, também não é aceito pelos tribunais o laudo final realizado unilateralmente pelo locador, por não possuir aptidão persuasiva necessária capaz de demonstrar que o locatário teria provocado danos ao imóvel locado mediante seu uso inadequado. Preserva-se, assim, os direitos do locatário em relação a possíveis deslealdades do locador. Nesse sentido:

LOCAÇÃO DE IMÓVEL. AÇÃO DE COBRANÇA E CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. LAUDO DE VISTORIA UNILATERAL. PROVA INSERVÍVEL. OBRIGAÇAO DO LOCATÁRIO EM REPARAR DANOS. ÔNUS DA PROVA. HONORÁRIOS.

1. Possível a responsabilização do locatário em reparar as deteriorações de uso normal do imóvel, desde que prevista em contrato, cabendo ao locador o ônus de provar as deteriorações decorrentes da utilização do imóvel pelo locatário.

2. O laudo de vistoria final elaborado sem a presença do locatário não possui idoneidade para fins de prova.

3. Verificando-se excessiva a fixação dos honorários advocatícios, sopesando a importância da causa e o trabalho desenvolvido, impõe-se sua redução.

4. Recurso conhecido e parcialmente provido.

(TJ-DF - APC: 20100112309420, Relator: SANDOVAL OLIVEIRA, Data de Julgamento: 26/11/2014, 5ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE: 09/12/2014. Pág.: 265)

Em conclusão, para se resguardar de eventuais vicissitudes ocasionadas pela postura do locatário em relação à conservação do imóvel, bem como por questões de defesa frente a possíveis desonestidades do locador, a realização de laudos de vistoria de entrada e de saída é extremamente recomendável, possuindo um efeito de dúplice proteção.

A inspeção não exige forma prescrita, podendo ser realizada a contento. Todavia, para que não haja futuros embaraços, deve ser assinada por todos os interessados, tais como locador, locatário, fiador e cônjuges. E ainda, é recomendável a presença e a assinatura de testemunhas.

O laudo deve conter as especificações do imóvel e seus componentes, indicando o estado de conservação em que se encontram, e, quando possível, deve ser complementado pelas fotos do imóvel.

Pedro Miguel - Advogado atuante nas áreas cível, tributária e trabalhista.
Fonte: Artigos JusBrasil

sexta-feira, 12 de agosto de 2016

DUE DILIGENCE IMOBILIÁRIA: VOCÊ SABE O QUE É?



Um produto jurídico muito oferecido pelos escritórios especializados em Direito Imobiliário é a chamada Due Diligence Imobiliária.

Mas muita gente ainda não sabe que é isso.

Due Diligence Empresarial.

A palavra teve origem no termo em inglês, que quer dizer “devida diligência”.

Esta palavra ficou muito conhecida no meio empresarial, pois, com as operações de compra e venda, fusões e aquisições de grandes empresas, é muito comum (e algumas vezes exigido por lei) a realização deste processo de “investigação”.

O processo de due diligence nas empresas consiste, basicamente, no levantamento de todas as informações e dados (financeiros, jurídicos, administrativos, de gestão, de pessoal, entre outros) relativos a empresa, para que sejam avaliados por um possível comprador ou investidor que queira adquirir esta empresa, diminuindo seus riscos na hora de fechar o negócio.

Due Diligence Imobiliária.

Na due diligence imobiliária, por sua vez, os profissionais especializados em direito imobiliário irão preparar ou analisar todos os documentos relativos a um imóvel, de modo que diminuam também ao máximo o risco envolvendo a aquisição ou a venda do imóvel.

Este serviço pode ser prestado tanto para o vendedor (organizando toda a documentação necessária para agilizar o processo de negociação e venda) quanto para o comprador (que quer ver analisada toda a documentação do imóvel que pretende adquirir, buscando a maior segurança possível).

No final da análise, é gerado um parecer, em que consta o resultado da “investigação”, com a opinião do profissional quanto aos possíveis riscos do negócio.

Mas aí você me pergunta: o corretor de imóveis já não faz este trabalho? Não está incluso na sua comissão/honorários a verificação correta dos documentos, sob pena, inclusive de responsabilização administrativa, civil e até criminal?

Então eu lhe respondo: Sim. Os corretores de imóveis, por exigência legal (artigo 723 do Código Civil e artigo 20 da Lei 6.530/1978, entre outras regulamentações) são obrigados a conferir toda a documentação relativa ao imóvel, não podendo permitir que as partes contratantes ignorem algum “defeito” na documentação da propriedade, que faça o negócio inseguro para qualquer das partes.

Mas então, para que serve uma due diligence imobiliária?

A due diligence imobiliária é um procedimento que vai mais a fundo na documentação, diminuindo ainda mais o risco na negociação de um imóvel, geralmente verificando dados em processos judiciais e administrativos, contabilizando riscos e dando pareceres sobre a segurança do negócio.

Muitos corretores (principalmente os que já possuem uma formação jurídica) já estão capacitados para prestarem estes serviços, porém, como eles demandam uma avaliação mais profunda e cuidadosa, geralmente são cobrados à parte do pagamento da intermediação do negócio em si.

Na maioria das vezes, porém, este procedimento é feito por um advogado especializado em Direito Imobiliário, justamente porque além da análise fria dos documentos, ele analisa também a possibilidade de existência de fraude contra credores, fraude à execução, possibilidade de perda do imóvel frente às dívidas de antigos proprietários, perda por evicção, entre outros aspectos jurídicos específicos, capazes de “melar” uma negociação.

Mesmo porque, não se pode exigir do corretor de imóveis, por exemplo, que ele analise o passivo tributário do vendedor de um imóvel (seja pessoa física ou jurídica) e diga se o negócio é seguro ou não, até porque, nos autos do processo pode haver um pedido de penhora do imóvel que ainda não foi registrado na matrícula e, desta forma, “passaria batido” em uma avaliação normal, mas seria certamente constatado em um processo de due diligence.

Documentos analisados.

Normalmente, em um processo básico de due diligence são solicitados 03 conjuntos de documentos:

1) Documentos do imóvel, dentre eles:

- Certidão de matrícula (no Cartório de Registro de Imóveis);

- Cópia do título de propriedade do imóvel (sentença, formal de partilha, contrato de compromisso de compra e venda, escritura pública, etc);

- Certidão de ônus reais relativos ao imóvel;

- Carnê do IPTU;

- Certidão negativa de tributos municipais e federais;

- Guias de ITBI pagas;

- Certidão atualizada com o histórico do cadastro de contribuintes do imóvel;

- Comprovante de pagamento de água, luz, telefone, gás, etc;

- Declaração da prefeitura que o imóvel não se encontra em local objeto de desapropriação, tombamento ou nas proximidades de imóveis tombados;

- Certidão de regularidade ambiental da prefeitura;

- Para imóveis especiais (tombados ou objetos de enfiteuse) exigir as certidões de regularidade (Certidão Autorizativa de Transferência de Ocupação e Certidão de Situação de Ocupação).

2) Documentos do vendedor (aqui incluídos o vendedor, seu cônjuge, independentemente do regime de bens e de todos os proprietários anteriores pelo período de, no mínimo, 15 anos):

- Documentos pessoais;

- Comprovante de residência;

- Declaração de participação societária em empresas;

- Consulta completa de SPC e SERASA;

- Certidão do cartório de protesto de título pelo período de pelo menos 10 anos;

- Certidão negativa de tributos federais, FGTS e estaduais (inscritos ou não na dívida ativa);

- Certidão negativa de débitos condominiais;

- Certidões de ações na Justiça Estadual Cível, Criminal (em alguns Estados também pesquisar na Vara de Falência e Recuperação Judicial e Extrajudicial), na Justiça Federal e na Justiça do Trabalho, das pessoas físicas e das empresas de que eventualmente forem sócios;

- Se o vendedor for pessoa jurídica: contrato social (última alteração), CPF e RG dos representantes legais, ata de autorização do conselho de administração da empresa autorizando a venda do imóvel, certidão de regularidade da empresa na Junta Comercial do Estado e na Receita Federal;

3) Documentos técnicos:

- Convenção de condomínio (quando for o caso);

- Regulamento interno do condomínio (quando for o caso);

- Cópia do registro de incorporação;

- Planta da unidade ou da casa;

- Auto de Conclusão de Obra (Habite-se);

- Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (quando for o caso);

- Projetos aprovados pela Prefeitura;

- Memorial descritivo;

- Anotação de Responsabilidade Técnica, quando a obra for feita por engenheiro ou Registro de Responsabilidade Técnica quando for feita por arquiteto;

- Alvará de construção;

- Certidão negativa do ISS (imposto sobre serviço – município) e do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social – governo federal)

- Outros projetos: hidráulicos, elétricos, estruturais, etc.

- Em casos de grandes terrenos ou áreas rurais é desejável que se apresente o levantamento planialtimétrico, a certidão de licenciamento ambiental ou o termo de compromisso de recuperação ambiental, a depender da situação do imóvel;

Em muitos casos, obviamente, não é possível a apresentação de todos estes documentos. Porém, para o processo de due diligence, cada documento possui um certo “peso”, fazendo diminuir gradualmente a capacidade de gerar certeza na negociação caso faltem alguns deles.

O ideal no processo, é que não haja qualquer mácula nos documentos apresentados, porém tal situação é quase impossível.

O trabalho da due diligence imobiliária é justamente analisar os apontamentos existentes nestas certidões e avaliar se eles serão capazes de “anular” o negócio por qualquer motivo, verificando também qual o grau de risco em adquirir ou não o imóvel.

Mas a due diligence não serve apenas para “achar problemas” nos imóveis e engessar os negócios imobiliários. Ela pode também estimulá-los.

Por exemplo: imaginemos que o vendedor possui 20 processos trabalhistas em sua empresa de que é sócio. Provavelmente este seria um problema para o comprador do imóvel que analisasse friamente este dado. Acontece, porém, que, se em uma due diligence fosse constatado que o valor das possíveis condenações fosse inferior a 10% do valor do imóvel, por exemplo, este poderia não ser, por si só, um impasse para a negociação.

Concentração dos atos na matrícula do imóvel.

Um outro aspecto a analisar é o conteúdo do artigo 54 e seguintes da Lei 13.097/2015.

Este artigo inicial instituiu no direito brasileiro a chamada “concentração dos atos na matrícula do imóvel”.

Segundo este artigo, todas as dívidas e demais bloqueios que recaiam sobre o imóvel (seja para garantir uma execução ou para aguardar o resultado de uma demanda) devem ser, obrigatoriamente, registrados na sua matrícula, sob pena de não poderem ser imputadas ao comprador de boa-fé.

A lei concede, no seu artigo 61, um prazo de 02 anos, contados do início da sua vigência, para que todos os credores registrem ou averbem nas matrículas dos imóveis os seus direitos creditórios, bem como demais atos jurídicos elencados no texto legal.

Ocorre que tal dispositivo ainda padece de muita incerteza no mundo jurídico, por vários motivos. O mais forte provavelmente é que: como se poderá alegar a boa-fé de um comprador que não avaliou sequer a documentação pessoal do vendedor e que não teve o cuidado de analisar nada além da matrícula do imóvel?

Outra crítica que se faz à lei é que, como o cadastro de imóveis não é unificado no Brasil, caso um credor possua uma dívida contra o devedor em São Paulo e este possua uma fazenda em Rondônia, até que o credor encontre este bem (se encontrar) o devedor poderá dispor livremente dele, agindo em possível fraude contra credores, por exemplo.

Em razão da novidade do instituto, veremos como ele será aplicado pelo Poder Judiciário.

Por enquanto, se faz extremamente necessária uma avaliação inteligente da documentação envolvendo a negociação de um imóvel, pois as preocupações futuras são capazes de gerar grande transtorno, tanto para quem vende e muito mais para quem compra.

Dyego de Freitas - Advogado. Sócio no escritório MAXIMIANO Advogados/Sorocaba SP.
Fonte: Artigos JusBrasil

terça-feira, 9 de agosto de 2016

COMO MANTER O PONTO COMERCIAL MESMO SE O LOCADOR NÃO QUISER RENOVAR O CONTRATO DE LOCAÇÃO



Uma grande dificuldade que o empresário pode ter em sua atividade ocorre quando precisa mudar de ponto comercial porque sua locação está chegando ao fim e o locador não quer mais renovar o contrato. A dificuldade é além da logística: encontrar um novo local, transportar os bens de seu estabelecimento de um local para o outro etc. A dificuldade maior, e que traz mais prejuízos, é a de conseguir manter aquela clientela que, dependendo do negócio (imagine uma padaria, drogaria ou supermercado) não se disporá a ir até o novo endereço, mas buscar outro comércio que seja mais próximo.

Remédio interessante é a Ação Renovatória de contrato de locação, prevista no artigo 51 da Lei 8.245/91. É um modo de manter o ponto, a clientela e o endereço. Com essa ação, o proprietário será obrigado a renovar compulsoriamente a locação ou, em certos casos, indenizar pela perda do ponto.

Para que seja possível promover essa ação, são necessários os seguintes requisitos:

1) O contrato deve ser escrito e por prazo determinado;

Um contrato verbal é válido, mas não dá para propor ação renovatória com um contrato verbal. E se o prazo for indeterminado (o que é raro), as regras são outras.

2) Contrato por prazo de 5 anos, admitindo-se a soma de contratos anteriores;

Se eu tiver um contrato de locação com prazo de 3 anos, não cabe ação renovatória. Agora, se ao término desse contrato o locador renovar por mais 3 anos, então ao todo eu tenho 6 anos, de modo que poderei entrar com essa ação caso, ao final dos 6 anos, ele se recuse a renovar o contrato.

3) Exercício da mesma atividade (ou semelhante) pelo prazo mínimo e ininterrupto de 3 anos anteriores;

Bem simples, se no ano passado o empresário comercializava sapatos e este ano computadores, não cabe renovatória. Mas se comercializava sapatos e hoje comercializa roupas, então está dentro do requisito.

4) Propositura nos primeiros 6 meses do último ano de vigência do contrato;

Ou seja, se o contrato termina em 31 de dezembro de 2016, eu tenho até 31 de junho de 2016 para propor a ação renovatória. Dica: passaram os fogos do ano novo, ligue para o advogado propor a ação (mas não esqueça de desejar um feliz ano novo a ele).

Agora, vamos às defesas que o locador do imóvel poderá utilizar para não haver a renovação:

a) Para reforma no imóvel determinada pelo poder público;

b) Para reformas que valorizem o imóvel;

c) Insuficiência na proposta de aluguel apresentada pelo locatário;

d) Para transferência de estabelecimento empresarial existente a mais de um ano, que pertença ao locador, cônjuge, ascendente ou descendente ou para sociedade da qual o locador detém mais de 50% do capital social;

e) Para uso próprio.

ATENÇÃO! O artigo 52, parágrafo 1º, da Lei de Locações, estabelece que quando a exceção de retomada tiver por fundamento: “d) a transferência de estabelecimento empresarial” ou “e) para uso próprio”, o locador não poderá exercer a mesma atividade que era exercida pelo locatário, impedindo-se assim que este possa se beneficiar da clientela criada por aquele. Portanto, na defesa, o locador tem que demonstrar em juízo que não atuará na mesma atividade do empresário anterior, durante 5 anos, sob pena de não só ter que pagar indenização e multa como ter que responder por crime tipificado na própria Lei de Locações (art. 44, II).

E quanto às hipóteses de indenização, o empresário poderá ser indenizado pelo locador quando:

a) Não der o destino alegado dentro do prazo de 3 meses a se contar da entrega do imóvel, por exemplo, a retomada era para uso próprio e o locador não está utilizando o imóvel

b) Locar o imóvel para outro que pague mais – se receber uma proposta de aluguel em condições melhores que aquela oferecida pelo locatário, o locador não é obrigado a renovar a locação. O artigo 72, parágrafo 2º, da Lei de Locações, exige que a proposta do terceiro seja reduzida a escrito e assinado por duas testemunhas. Essa proposta deverá ser juntada na exceção. Nesta hipótese, o locador será obrigado a indenizar o locatário pela perda do ponto.

Na proposta assinada pelo terceiro, deverá haver clara indicação do ramo que será explorado por ele, que não pode ser igual ao do locatário. Novamente, protege-se aqui o ponto comercial do empresário.

DICA PRÁTICA: deve-se tomar muita cautela no patrocínio dessa ação, visto que não se trata de um processo fácil. Ainda que o empresário tenha sido o melhor inquilino de todos os tempos, pago todos os aluguéis sem atraso e obedecido a todas as cláusulas contratuais o tempo todo, o juiz ainda irá avaliar se manter o endereço em questão é o único meio de proteção do ponto empresarial, portanto necessário muito zelo tanto do autor quanto do profissional advogado em deixar bem claras e provadas tais questões. Também necessário ficar atento ás exceções acima e, em caso de ocorrerem alguma das hipóteses de não renovação, fiscalizar o locador.

A Ação Renovatória, portanto, é uma excelente forma de proteger o ponto comercial. Também indispensável conhecer as hipóteses em que o locador não pode ser obrigado a renovar a locação, porém continua obrigado a não abrir um ramo de atividade igual ao do empresário anterior, para não incorrer em concorrência desleal. Assim, o ponto empresarial, a livre concorrência e a clientela do empresário ficam protegidos.

Celso Carvalho - Advogado
Fonte: Artigos JusBrasil

segunda-feira, 8 de agosto de 2016

CONSIDERAÇÕES SOBRE A ASSISTÊNCIA TÉCNICA JUDICIAL EM AVALIAÇÃO DE IMÓVEIS



Da assistência técnica judicial

Espera-se do assistente técnico avaliador de imóvel o acompanhamento da perícia. Esta última no sentido amplo, que compreende: i) elaboração de quesitos; ii)acompanhamento do perito em vistoria ao imóvel; e iii)impugnação ao laudo pericial.

Estas três etapas resumem a participação do assistente técnico avaliador no processo. No entanto, cada uma delas enseja ações prévias preparatórias, que demandam tempo para dedicação ao estudo das particularidades de cada caso, vivência e experiência com o mercado imobiliário, conhecimento das normas técnicas (metodologias, cálculos, procedimentos, estratégias), expertise e capacidade intelectual para o desenvolvimento lógico explicativo.

Um aspecto em especial, é a experiência enquanto Perito, não como atividade profissional paralela ou complementar, mas como oficio principal e atuação (nomeação) constante, pela experiência em “causa e efeito” de cada etapa do processo e do comportamento do Juízo frente às questões inerentes à perícia. Aspecto esse, com bastante influência no direcionamento do resultado da perícia, e consequentemente do julgado, ao pleiteado pela parte.

O momento certo da contratação do Assistente Técnico

Para melhor efeito no convencimento do juízo, a assistência técnica judicial deve ser contratada no início do processo, para se estabelecer relação do caso concreto com o comportamento do mercado imobiliário, afim de instruir a inicial com parâmetros argumentativos e valores bem fundamentados, ou, me sede de contestação, para contra razoar a peça vestibular e direcionar a defesa dos interesses da parte, também fundamentada em laudo anexado.

A qualidade e a profundidade da fundamentação dos argumentos trazidos nas teses das partes, pela análise criteriosa do Assistente Técnico no início da demanda judicial, possibilitam o julgamento antecipado da lide, sem as incertezas que norteiam a perícia; e não sendo o caso, por constar dos autos desde o início do processo, propiciarão a formação do convencimento do Perito (na análise pericial) e do Juízo (no julgamento). E, ainda que não haja a perícia esperada, ou que nesta não se tenha mais o mesmo assistente técnico, o custo inerente ao serviço, ainda que limitado ao início do processo, é compatível com a excelência alcançada na argumentação vestibular, ou nas contrarrazões em contestação.

De todas as etapas que envolvem a assistência técnica judicial, a impugnação ao Laudo Pericial é a menos efetiva, pois, lançado o resultado pelo Perito, é remota a chance de alteração deste, e rara a possibilidade de julgamento diferente do alcançado no Laudo Pericial. Sendo assim, o sucesso na ação está intimamente relacionado com o quanto o perito e o juízo estarão convencidos dos argumentos da parte, o que direcionará o resultado da perícia, e consequentemente do julgado.

De forma que, a contratação tardia da assistência técnica limita a atuação profissional ao acompanhamento do Perito em vistoria ao imóvel e à impugnação ao Laudo Pericial, diminuindo imensamente o potencial de direcionamento do resultado da lide ao esperado pela parte.

Falhas frequentes

1- Contratação tardia da assistência técnica judicial;

Contratada a assistência técnica judicial apenas quando da nomeação do perito pelo Juízo, por entender, o Patrono, que a questão só se inicia quando deferida a perícia, ou ainda, após a elaboração dos quesitos, por dificuldade de encontrar profissional habilitado em tão curto prazo (5 dias). Limitando o potencial de argumentação e fundamentação das peças vestibular e contestação, bem como a profundidade e o alcance dos quesitos no convencimento do Perito e do Juízo.

2- Não contratação da assistência técnica;

Quando a parte adversa contrata assistente técnico que interage com o Perito se utilizando de dados novos relevantes ao processo, esta tem mais chance no convencimento do Perito, quanto às teses defendidas. Se isentar do custo com o assistente técnico pode acarretar prejuízos maiores dependendo do resultado da causa. O custo com assistência comumente é inferior ao benefício com a consolidação da provas e convencimento do Perito, a partir da atuação do profissional.

Além disso, a impugnação do Laudo Pericial feita por leigos, não reflete propriedade com a técnica e conhecimento da causa, muitas vezes apenas repete argumentos já trazidos aos autos, quando, nesta etapa, não basta o descontentamento com o resultado, mas é preciso demostrar detalhadamente e didaticamente o efeito diverso que se teria com as interferências e correções apresentadas.

3- Contar com a realização da Pericia

Compete ao Juiz o julgamento antecipado da lide, quando encontra na ação os requisitos para tal. Também nos casos em que a parte desiste da perícia, as provas demonstradas nos autos nortearão o julgamento. Favorecendo a parte que instruiu, desde o início, com prova robusta, argumentos e valores coerentes com o comportamento do mercado imobiliário, demonstrados por laudo técnico realizado pelo profissional assistente. De forma que, instruir a ação apenas com indícios (provas rasas), contando com a perícia, que não necessariamente irá acontecer, pode comprometer o resultado esperado para a demanda.

4- Argumentação sem fundamento técnico e/ou em valor diferente do alcançado no mercado:

Quando causa demanda efeito em valor de mercado imobiliário, normalmente o pleito é por quantia arbitrada por leigo (parte na causa, ou Advogado), e instruída com indícios (anúncios online), esvaziando o potencial de convencimento e, não raramente, destoando do que será resultante da análise pericial, em prejuízo para a parte que poderia ter explorado melhor o quantum pedido. Não é raro conclusão pericial diferente do pretendido por ambas as partes, em que se poderia pedir mais, ou menos, se se conhecesse antecipadamente o resultado esperado com a avaliação técnica do mercado imobiliário.

Ex.: Renovatória de locação em que o Autor/locatário propõe arbitramento judicial do aluguel em valor maior que o de mercado;

5- Elaboração de quesitos superficiais

A elaboração de quesitos deve partir da análise profunda do caso concreto, e das formas de se provar o alegado, o que envolverá conhecimento técnico, experiência com o comportamento do mercado imobiliário (tendências, conjuntura e fatores de valorização relevantes), bem como a análise do conteúdo esposado pelas partes nos autos do processo. Diferente disso, serão superficiais, não direcionarão o convencimento do Perito e do Juízo ao resultado desejado.

Além disso, quesitos cuja resposta é óbvia, ou já constará obrigatoriamente do Laudo Pericial, são desnecessários e tornam prolixa a defesa das teses abordadas. Entenda-se como superficial o quesito:
- cuja resposta é óbvia;
- cuja resposta é elemento obrigatório do Laudo Pericial;
- cuja resposta não remete, o Perito e o Juízo, ao desenvolvimento lógico da tese defendida;
- que não confronta a tese controversa, nem reforça a tese defendida;

Conclusão

Por todo o exposto, sempre que a demanda versar sobre valor relativo ao mercado imobiliário, este Perito Forense recomenda a contratação de profissional para a atuação como Assistente Técnico, desde o início do processo. Preferencialmente profissionais que tenham como principal atividade a perícia forense, para cumular a prática, o conhecimento técnico e o conhecimento dos trâmites forenses.

Quem inicia uma demanda judicial envolvendo valor relativo ao mercado imobiliário (Exemplos: compra e venda, alienação judicial de bem imóvel, aluguel, indenização, defeito construtivo, área diminuta, atraso de obra, desapropriação, penhora de bem imóvel, servidão administrativa, entre outras), já deve contar com o custo da Assistência Técnica, ou assume o risco de ter a defesa de seus interesses prejudicada por desconhecimento e inexperiência em relação ao comportamento do mercado imobiliário.

Júlio Delamôra - Advogado Imobiliário. Perito Avaliador de Imóveis
Fonte: Artigos JusBrasil

sexta-feira, 5 de agosto de 2016

A RETROVENDA



Retrovenda é uma espécie de contrato onde o vendedor reserva para si o direito de recobrar o imóvel dentro de um determinado prazo e nas condições previstas pelo código civil, especialmente as cláusulas 505 a 508.

Desta forma, o prazo para o exercício deste direito, é de no máximo três anos, sob pena de – não utilizado – consolidar-se o domínio em favor do comprador em face a ocorrência da decadência, ou seja, a perda do direito de ação.

Esta espécie de contrato não é muito comum, mas tem acontecido quando pessoas que, pelo apego que têm às suas coisas, na necessidade de dispor delas, precisam manter a esperança de poder recuperá-las dentro deste prazo.

Assim sendo, diante da dificuldade ou da premente necessidade do recurso, o preço até pode ser menor do que realmente vale, facultando-se a recompra dentro do prazo estabelecido, de até três anos.

O novo código civil brasileiro cuidou melhor deste instituto no já mencionado artigo 505, explicitando de modo claro que “O vendedor de coisa imóvel pode reservar-se o direito de recobrá-la no prazo máximo de decadência de 3 (três) anos, restituindo o preço recebido e reembolsando as despesas do comprador, inclusive as que, durante o período de resgate, se efetuaram com a sua autorização escrita, ou para a realização de benfeitorias necessárias.”

Deste modo, ao recomprar o imóvel, o vendedor deverá pagar ao comprador o preço desembolsado e atualizado, além das despesas com escrituras e certidões, além de outras que eventualmente tenha autorizado. Se o comprador se recusar a receber as quantias a que faz jus, no prazo fixado, o vendedor terá que depositar judicialmente o valor devido, reivindicando no mesmo pedido a sua reintegração da posse do imóvel que será concedida liminarmente em sede de tutela antecipatória.

O direito de retrato, que é cessível e transmissível a herdeiros e legatários, poderá ser exercido contra o terceiro adquirente. A lei não proíbe que se institua outros valores para o exercício do resgate. A direito a ele, em face a esta instituição, há de ser exercido nos termos da convenção estabelecida. Assim, se esta previu o pagamento de parcelas excedentes das duas mencionadas na lei (do preço pago e das despesas feitas pelo comprador), o vendedor terá de pagar a este o valor de tudo o que se obrigou a pagar. 

Tratando de resgate convencional, todas as obrigações deverão constar expressamente do documento, sob pena de não poder ser exigido, salvo aquelas previstas no código civil, já mencionadas.

Ivan Pegoraro
Fonte: Advogados Associados Ivan Pegoraro & Leate